25 de jun. de 2004

Corpo humano


E se eu gosto de músculos deve ser por causa da consistência deles. Mas eu gosto mais quando consigo envolvê-los na minha mão. Quando posso acreditar que por um instante faço parte e estimulo aquela rigidez. E se eu não gosto de banha deve ser porque ela se espalha à medida que eu pressiono. E muda de forma. E não oferece a mínima resistência, até chegar no osso. Por isso é que eu devo gostar de osso: porque para mudar os ossos de uma pessoa é preciso um mínimo de violência. E eu gosto do que não se adapta a mim. Gosto de relacionar-me com algo de imutável e de exclusivo. Não preciso que ninguém se vista de mim para ter acesso ao que ofereço. Esse acesso é inevitável. Prefiro que as pessoas continuem vestidas como as encontrei e que por trás de cada traje hajam músculos e ossos a espera. Músculos em busca de estímulos e ossos satisfeitos, calcificados. E que não haja banha, porque não quero interromper o estado de nada. Quero potencializar. Essencialmente de um, potencialmente de todos.

18 de jun. de 2004

Aos mestres


Tem professores que corrigem os trabalhos dos alunos, mas eu os leio. Da mesma forma que leio os meus autores, leio os meus alunos. Ler um trabalho é bem diferente de corrigi-lo.

Professora Roberta

Algo como um respeito independente, inerente a qualquer relação. Uma predisposição à troca, uma libertação de hierarquias e formalizações. Tudo isso a qualquer momento, com qualquer pessoa. Em suma, a onda do momento: livrar-se de pressupostos.

11 de jun. de 2004

O que é divino



Eu acho que levar a sério tensiona, deixa você ineficaz, porque você fica intelectualizando as coisas. Eu acho que nada que é sério demais pode ser divino, sabe? O Domingos fala isso. O Domingos fala um negócio que é maravilhoso, que depois que você pensa, ele fala: "Tudo que é divino é sem esforço". O momento do gozo não tem esforço. Tem aquela coisa toda antes, mas na hora do êxtase ele é sem esforço. E tem que ser. E eu fui descobrindo isso, porque eu não tinha prática...

E não é que a Maitê tem as suas afinidades com o Nikos... Nessa entrevista ela fala sobre o trabalho, mas me atrevo a dizer que é sobre a vida também. "Tudo o que é divino é sem esforço": além de um ótimo jeito de ver as coisas, uma boa frase pra tatuagem (será?).

5 de jun. de 2004

Devaneios midiáticos


Já faz um tempo que assisto à novela das sete sempre que posso. E morro de rir. Gosto dela porque o autor está livre de qualquer compromisso com a verossimilhança ou com a representação da realidade. Uma novela leve, enfim. Num dia qualquer dessa semana, assisti à seguinte cena:

Ulisses, Verinha e Eduardo na sala de um apartamento chique. Ulisses tenta fugir do apartamento com um baú pesado, cheio de ouro. Num determinado momento, Eduardo bate com uma frigideira na cabeça de Ulisses, que desmaia. Nesse instante Verinha (Maitê) pára a cena e pergunta a Eduardo: "Espere aí! O que é que uma frigideira estava fazendo no meio da sala?". E Eduardo responde: "Providência divina!".

Providência divina que nada. Tratava-se de uma licença poética, em plena novela das sete. E dessa vez o autor resolveu dar voz - e resposta - aos telespectadores mais acostumados com o realismo excessivo que permeia as novelas. Genial.

Mas fica a pergunta: será que a Maitê participou da concepção da cena? Aliás, se vir alguma entrevista com a Maitê, não perca. Ela é surpreendente.