22 de nov. de 2011

Todos somos


Todos nós brasileiros somos carne daqueles pretos e índios supliciados. Todos nós brasileiros somos por igual a mão possessa que os supliciou. A doçura mais terna e a crueldade mais atroz aqui se conjugam para fazer de nós a gente sentida e sofrida que somos, e a gente insensível e brutal que também somos.

Darcy Ribeiro

3 de mai. de 2011

Arde


Manoel já havia sido um cara apaixonado, ainda que isso, hoje, fosse um pouco difícil de se acreditar. Acontece que o amor havia acabado, e ele, sem perceber, havia pintado na parede de casa um retrato colorido e bonito daquilo tudo. Por um fenômeno difícil de se explicar, o retrato havia entranhado nas paredes, de um jeito que não adiantava raspar ou retintar - a imagem sempre aparecia de novo. Uma vez cavou a parede, e o que viu foi um retrato ainda mais nítido do velho amor. Cavou, então, mais um pouco, e acabou fazendo um buraco na própria casa. E sempre que a noite esfriava, a casa ardia um pouco mais.

5 de abr. de 2011

Esperança


Julieta esperava do mundo uma sinceridade clara e simples, tal qual ela pretendia oferecer-lhe. Viu, mais tarde, que não era bem assim. Primeiro ficou um pouco confusa. Depois ajustou um pouco a sua forma de receber e dar-se. Aí ficou tudo bem.

1 de abr. de 2011

O próximo passo


Benjamin estava só. Já não podia se distrair com a morte tão bem disfarçada de vida. De qualquer lado que o viam, havia uma vida escondida. Gostaria de encurtar distâncias, de aproximar-se ainda mais daqueles que melhor o conheciam e que mais torciam por ele. A vida por detrás dos véus já não fazia mais sentido. A solidão, sempre ela, indicava que era hora do próximo passo.