28 de nov. de 2007

Ausência


"Não", eu disse, "não sinto saudades suas". Ela falou algo que não consegui ouvir. "Fala mais alto", gritei. A ligação estava péssima, talvez fosse a chuva, quem sabe apenas a porcaria do telefone sem fio, mas eu mal conseguia ouvir a sua voz. "Como é que você não sente saudades de mim", ela gritou, "há dois dias você disse que me amava e agora vem com esta história de que não sente saudades de mim". Respirei fundo. Olhei para a cozinha. Sobre a pia havia um prato com um croissant pela metade. Segurei o telefone sem fio com força. "Ontem eu fui ao supermercado. Você disse que deveria comprar água, lembra? Disse no dia em que voltou para sua casa. Pois então eu fui ao supermercado comprar água mineral. E resolvi comprar pão também. Aí aconteceu: eu vi um pacote de croissant. Deu um aperto danado no peito, juro, mas resolvi levar um pacote. Sei lá. Não gosto tanto de croissant como você gosta, mas pensei que se eu comesse um deles nós dois estaríamos dividindo um momento novamente. Quando cheguei em casa e preparei o sanduíche de croissant, não sei o que aconteceu comigo. Não pude comer mais do que a metade. De repente, tudo em mim começou a doer. Doer não é bem a palavra. Tudo em mim começou a, isso, tudo em mim começou a esvaziar. Eu estava ficando vazio. Minha vida parecia não existir mais e sabe por quê? Porque você não estava mais ali ao meu lado comendo comigo um estúpido croissant. O que eu quero dizer com isso? Que muitas coisas perderam o sentido desde o momento em que você saiu por esta porta. Coisas bobas como comer um croissant mas que, ao seu lado, se tornam tão importantes, se tornam vitais até. São estas coisinhas que enchem a minha vida de, sei lá, vida. Então, quando você pergunta se estou com saudades, eu digo não. Não sinto saudades suas. Sinto muito mais que saudades. Eu sinto falta sua. Com saudades a gente consegue conviver. Agora, com a sua ausência eu não vivo. Você faz falta porque você faz parte de mim, entende? Alô?". Ela tentava dizer alguma coisa. Mas eu não ouvia nada. Droga de telefone sem fio. "Mais alto", eu disse. E então eu ouvi seu grito. "Desliga esta porcaria de telefone e vá ao supermercado comprar mais croissants", ela falou. "Quantos você quer?", perguntei. "Quantos você acha que pode comer durante toda sua vida?", ela gritou. E foi assim que minha vida se encheu novamente. Feito um carrinho de supermercado.

André Takeda

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