11 de set. de 2003

Por acaso


Às vezes o acaso faz falta. A vida anda muito objetiva e apressada e quase que não sobra tempo para "perder tempo". E ter tempo pra perder, pra não se comprometer com nada e deixar o acaso governar é fundamental. Todos os passos da evolução científica caminham para uma vida ainda mais objetiva e terrivelmente dinâmica.

Nunca fui daqueles que fica perambulando por aí, exceto em alguns dias complicados, para os quais perambular é o melhor remédio. Mas, até pouco tempo atrás, eu sempre dava uma voltinha a pé por aí, depois de qualquer compromisso e antes de voltar para casa. Nessas andanças, encontrava gente que não encontraria, descobria eventos dos quais não saberia e via casas, prédios e pessoas que não veria em outra situação. E a cada dia eu experimentava um novo ponto de ônibus, e um novo trajeto até cada um desses pontos. Depois que passei a andar de carro, as coisas se tornaram muito mais objetivas. Saio de casa, estaciono, desço, faço o que tenho que fazer e depois volto pra mesma casa de sempre. Ainda que o que eu tenha que fazer varie bastante, é só lá a minha chance de ter algum contato com o acaso.

Outro dia meu professor falava sobre um possível futuro para a televisão: os programas estarão disponíveis em satélite. Quando quiser assistir a um programa, é só "baixá-lo" através desse satélite. Aí eu penso: e aqueles programas, aquelas entrevistas que pegamos o finalzinho, aqueles seriados que nunca tínhamos visto, aquele filme que a gente vê só um trechinho... Poxa. E o acaso?

No Central do Brasil, a Dora diz que deveríamos andar só de ônibus, porque ele faz sempre o mesmo trajeto. Pra ela, andar de táxi é um perigo. Táxi faz retorno, varia o caminho, sempre pode levar ao engano ou a algum prejuízo. Daí ela pega um táxi ao encontrar o Josué e encontrar na vida dele um jeito de voltar a viver. Seguindo essa metáfora, afirmo com convicção: de vez em quando andar de táxi é muito importante e sem dúvida vale à pena enfrentar os altos custos de uma viagem como essa.

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