9 de jul. de 2004

Carta para Marina


Odeio essa distância que nos separa. Odeio não estarmos mais ligadas pelos laços da vida em comum que a infância - mesmo em lugares tão diferentes - proporciona. Odeio termos tomado rumos tão diferentes e agora existir comum à nós apenas o laço da amizade. Porque à vezes ponho em dúvida a força desse laço e fico me perguntando se eventualmente ele não pode vir a arrebentar.

Me assusta ficar tanto tempo sem conversar com você; você que tantas vezes foi a minha própria voz, que tantas vezes foi minha irmã, que usei para dizer à mim o que eu gostaria de dizer; que tantas vezes foi minha porta voz à mim mesma.

Você que tantas vezes foi quem me segurou de pé, me segurou no colo, e de tantos outros modos que eu não saberia precisar nem tampouco entender. Ou explicar.

Me lembro quando a conheci, época em que três anos a menos ou a mais era o que diferenciava uma criança de uma moça; mas penso que nunca foi problema para nós, passamos por tudo quase que simultaneamente. Uma precoce demais, a outra atrasada demais, e entre demoras e adiantamentos encontramos juntas no tic tac do relógio o nosso próprio tempo.

Conversar com você sempre foi o mesmo que conversar comigo, perdi a conta de quantas cartas à você comecei confusa e finalizei esclarecida após relatar-te os fatos. Fatos que eu repetia vinte vezes em no máximo vinte e três folhas, frente e verso; e você lia e comentava cada frase, cada intenção. Sem falar nos envelopes gigantescos destinados aos nomes mais estranhos possíveis aos olhos dos carteiros e dos vizinhos. Sinto falta desse chão que você sempre foi para mim.

Talvez porque a infância terminou e passamos de adolescentes à adultas sem que nos déssemos conta, e acabamos por aprender a sermos nosso próprio chão. À dar à nós nossos próprios colos.

Isso nos faz independentes. E reduz nossa ligação à meros laços de amor que criamos durante os anos. Não mais a vida em comum. Não mais os mesmos caminhos. Não mais os mesmos ideais e provavelmente nem mais os mesmos planos. Que dirá então, um futuro em comum.

Laços de amor e de amizade. Amizade que não é mais a mesma, que deu espaço à trabalhos, obrigações, preguiças, namoros, amigos fisicamente próximos, e tantas outras fatalidades? obstáculos? interesses? que às vezes me parecem terem alcançado o que os quilômetros jamais conseguiram.

Me pergunto então, se o laço que nos une é mesmo assim frágil a ponto de partir-se de fato. Ou ainda, simplesmente soltar-se... e caso isso viesse a acontecer, estaríamos afinal livres uma da outra, soltas pelo espaço flutuando...

Tento descobrir o que seria então de mim. O que seria de nós. Reduziríamos à nada uma à outra.

Sinto medo. Medo de não precisar mais que seja meu chão; medo que talvez você também não me precise mais. Medo de ter crescido e, inevitável, ter-me tornado sozinha como qualquer pessoa.

Mais medo ainda por perceber que hoje preciso de você de outra forma. Pela simples existência destes laços de amizade e amor que formaram-se com o passar destes anos; que são a única coisa que agora resta-nos em comum.

E que eu espero serem fortes o suficiente para não deixar que nos percamos eu de você e você de mim; pelo único motivo de eu te amar tanto assim e você ser ainda, a minha número um.


Esse texto não fui eu quem escreveu, foi a Thaís Capusso. Eu não a conheço. Ele estava aqui guardado e resolvi postar, já que vou viajar e não tinha nada pertinente pronto. Acho-o bom de ler, de pensar. Bom, é isso: amanhã bem cedo lanço-me formalmente ao acaso. Cazuza para todos!

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