9 de ago. de 2003

Estranhamento


Estava no meio de uma das minhas excursões intergaláticas, quando minha nave apresentou problemas gravitacionais e terminou por cair em um planeta estranhamente azul. Já tinha ouvido falar desse planeta antes, além de ter estudado um pouco as invenções dos habitantes do mesmo. Mas continuando a história, apesar de ter caído em um planeta azul, a verdadeira superfície em que caí era verde. Estranhamente verde. E estranhamente desabitada. Seria uma área ainda desconhecida pelos habitantes? Pensava que sim, até ver alguns indivíduos moverem-se lentamente em um grupo bastante numeroso para uma determinada direção. Me aproximei sem que eles percebessem. E tratei de tornar a minha nave invisível, para evitar grandes tumultos.

Observei então que os indivíduos pararam e passei a reparar em suas faces. Todos eram extremamente expressivos. Segundo o que eu havia estudado, todos expressavam tristeza. Nunca entendi muito bem, mas diziam em meu planeta que a tristeza é um sentimento - e um sofrimento. Percebi também que quatro daqueles indivíduos carregavam um grande recipiente. Aprendi em meu planeta que os indivíduos que habitavam o planeta azul eram muito apegados aos seus bens. Talvez estivessem se desfazendo de algum bem. Mas não sei porque sentiam tanta tristeza, porque em pouco tempo poderiam adquirir outro bem daqueles. Ou substitui-lo por outro bem de melhor qualidade e maior utilidade. Decidi continuar observando-os. E constatei uma importante evolução daqueles indivíduos: como nós, eles já se vestiam da mesma forma. Os mesmos pararam de se preocupar com moda e estética.

Mas enquanto eu reparava nos costumes daqueles indivíduos, percebi que o recipiente desapareceu. E observei que as faces tornaram-se ainda mais cheias de tristeza. Alguns indivíduos partiram, então. Três ou quatro permaneceram, ainda estavam cheios de tristeza. Os que partiram tinham outro sentimento nas faces. Se não me engano, era o que se chama de alívio. Aquilo que meus antepassados sentiam - sim, um dia já sentimos mesmo em nosso planeta - quando completavam suas missões intergaláticas. Foi o que quase senti naquela hora, se eu soubesse o que é sentir. Eu percebia que tinha presenciado um raro momento. Havia aprendido em meu planeta que os indivíduos do planeta azul se sentiam tristes com a alegria dos outros e sentiam alegria com a tristeza dos outros. Naquele momento, todos estavam tristes. Era realmente um momento especial para eles.

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